Violência em escolas do DF cresce e acende alerta: mais de 3,5 mil ocorrências em dois anos

Os números são alarmantes e revelam um cenário que exige atenção imediata das autoridades. Entre 2024 e 2025, 3.559 ocorrências criminais foram registradas dentro ou nas imediações de escolas do Distrito Federal, segundo relatório divulgado pela Polícia Civil (PCDF), por meio da Divisão de Análise Técnica e Estatística (DATE). O levantamento, feito a partir dos dados do Painel SEPAC, considera casos com vítimas físicas e endereços identificados como unidades escolares da capital.

Somente em 2024, foram 2.210 registros. Entre janeiro e julho de 2025, o número já alcança 1.349 ocorrências, mantendo o ritmo elevado. As regiões administrativas de Brasília (500 casos), Ceilândia (440), Taguatinga (365), Gama (261) e Samambaia (259) lideram o ranking e, juntas, concentram mais da metade (52%) dos crimes registrados em ambientes escolares. Também aparecem com índices expressivos as Asas Sul e Norte, o Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), o Cruzeiro, a Vila Planalto e a região central, áreas com grande concentração de instituições de ensino público e privado.

No comparativo entre os primeiros semestres de 2024 e 2025, houve alta de 2% nas ocorrências — de 1.146 para 1.169 casos. Ceilândia teve crescimento de 6%, enquanto Gama e Samambaia registraram aumentos de 25% e 20%, respectivamente. Já Taguatinga (-16%) e Santa Maria (-25%) apresentaram queda nos índices.

Ameaças e agressões lideram registros

As ameaças aparecem como o crime mais recorrente, representando 14,63% do total de registros. Em seguida vêm as lesões corporais (7,83%), injúrias (7,42%) e vias de fato (4,55%). Casos de furto de celular correspondem a 2,3% dos registros, enquanto crimes contra a honra, como difamação e calúnia, somam cerca de 3%.

O levantamento também aponta 93 casos de bullying (1,47%), 89 de importunação sexual (1,40%) e 84 de injúria racial (1,33%). A PCDF destaca que muitas ocorrências envolvem mais de uma natureza criminal, o que amplia o número de infrações registradas.

As vítimas são, em sua maioria, adolescentes. Jovens entre 12 e 17 anos representam 41% do total, e as meninas aparecem mais vulneráveis, com 55,8% dos registros. Crianças de 6 a 11 anos também aparecem com participação significativa — quase 10% das vítimas.

Especialista aponta causas e soluções integradas

Para o especialista em segurança pública Fagner Dias, professor de Administração e Segurança Pública do Ibmec Brasília, o aumento expressivo de registros de violência nas escolas do DF não significa, necessariamente, que a criminalidade dentro das unidades tenha crescido. Segundo ele, o principal motivo está na melhoria da forma de coleta e catalogação dos dados pela Secretaria de Segurança Pública, que passou a adotar critérios mais precisos de registro.

“Por muito tempo, havia uma subnotificação dessas ocorrências. A forma como os dados eram classificados não tinha alto nível de precisão. Recentemente, o método de captação foi aprimorado, e situações que antes não eram contabilizadas passaram a aparecer nas estatísticas”, explica o especialista. Dessa forma, o crescimento nos números observados nos últimos dois anos reflete, em parte, a redução da subnotificação e não necessariamente um aumento efetivo da violência.

Fagner destaca, no entanto, que outros fatores estruturais e sociais também contribuem para o cenário atual. Entre eles, a falta de profissionais especializados em mediação de conflitos dentro das escolas e a vulnerabilidade social dos territórios em que muitas unidades estão inseridas. “Escolas localizadas em áreas de maior vulnerabilidade tendem a registrar mais casos de violência, porque os problemas do entorno acabam se refletindo dentro da escola. Ela não é uma bolha isolada dos conflitos sociais que acontecem ao seu redor”, afirma.

Segundo o professor, reforçar a segurança escolar passa por diferentes frentes: capacitação constante, políticas socioemocionais e melhorias na infraestrutura. Internamente, ele aponta a necessidade de formação continuada de profissionais que atuam na mediação de conflitos e o fortalecimento das equipes escolares. “Os programas sociais ou de segurança pública que envolvem aspectos socioemocionais são os que têm melhor resultado na redução de conflitos. No DF, o único já consolidado é o Proerd, da Polícia Militar, que trabalha essa base de desenvolvimento emocional. Seria importante ampliar o programa ou criar novas iniciativas baseadas em experiências de sucesso, como as que existem em São Paulo”, analisa.

No ambiente externo, o especialista defende o reforço do policiamento comunitário escolar e a atenção ao design ambiental das escolas, que influencia diretamente no comportamento e na percepção de segurança. “O ambiente físico precisa favorecer o convívio seguro. A escola deve ser bem iluminada, ter pintura adequada, faixas de pedestres, calçadas e sinalização em bom estado. Todos esses fatores ambientais ajudam a reduzir a criminalidade e a sensação de vulnerabilidade”, explica.

Ele também chama atenção para a influência da estrutura familiar no comportamento dos estudantes. Em regiões mais pobres, onde há maior desagregação social, a ausência de um dos responsáveis, o encarceramento de pais e a falta de vínculos familiares acabam se refletindo dentro das escolas. “Muitos alunos vivem realidades difíceis, com pais ausentes ou em situação de vulnerabilidade. Esses contextos acabam desaguando na escola e exigem uma resposta articulada entre diferentes órgãos”, pontua.

Por isso, Fagner defende que o enfrentamento da violência escolar deve ser intersetorial, envolvendo não apenas a Secretaria de Segurança Pública, mas também a Secretaria de Educação, a Secretaria de Desenvolvimento Social, a Polícia Militar e outros órgãos. Ele cita o programa CPTED — Crime Prevention Through Environmental Design, desenvolvido pela Secretaria de Segurança Pública, como um exemplo de política que pode contribuir se for aplicada de forma efetiva.

“O CPTED é uma iniciativa importante, mas precisa ser implementado à risca. Tudo o que está sendo mapeado como problema de design ambiental nas escolas precisa ser resolvido para que o programa dê suporte real às ações das forças de segurança e de proteção social. É um trabalho que exige cooperação e continuidade”, conclui o especialista.

Casos recentes reforçam urgência de medidas

Os dados ganham peso diante de casos recentes, como o ocorrido no Centro de Ensino Fundamental (CEF) 31, em Ceilândia, no último dia 22 de setembro. Vídeos que circularam nas redes sociais mostraram estudantes portando facas e proferindo ameaças dentro da escola, o que gerou apreensão entre pais e alunos.

Segundo a Polícia Militar do DF (PMDF), os alunos envolvidos foram identificados, e a direção da escola adotou medidas administrativas imediatas. O Batalhão de Policiamento Escolar (BPEsc) informou que intensificou o monitoramento da unidade, com operações direcionadas e reforço de presença policial.

Somente em 2025, o batalhão já realizou 101 visitas ao CEF 31, dentro do Roteiro de Patrulhamento Escolar. “O BPEsc permanece atento a quaisquer situações de ameaça em escolas públicas ou privadas e conta com a colaboração da comunidade para o envio de denúncias e informações que contribuam para a manutenção da ordem pública e da segurança de alunos, professores e servidores”, diz a corporação em nota.

Ações pedagógicas e acolhimento

A Secretaria de Educação do DF (SEEDF) confirmou que o CEF 31 tomou conhecimento das imagens em 22 de setembro e que os responsáveis pelos estudantes foram convocados. De acordo com a pasta, não houve qualquer agressão física.

Em nota, a secretaria afirmou que o caso passou a ser acompanhado pela Assessoria Especial de Cultura de Paz (AECP), que atua junto à escola e aos órgãos de segurança. “Foram adotadas todas as medidas administrativas e pedagógicas cabíveis, incluindo reforço do policiamento nos horários de entrada e saída e ações educativas internas”, informou a SEEDF.

A pasta reforça que a rede pública não tolera comportamentos que coloquem em risco a integridade da comunidade escolar e que as medidas previstas no Regimento Escolar, como advertência e suspensão, são aplicadas quando há condutas que possam configurar atos infracionais.

Desafios

O relatório da PCDF, concluído em 8 de setembro de 2025, serve como base para orientar políticas públicas voltadas à proteção da comunidade escolar. A corporação destaca que as ocorrências vão muito além de furtos e depredações: envolvem violência psicológica, ameaças, agressões físicas e crimes de discriminação, exigindo uma resposta integrada entre escolas, forças de segurança e famílias.

Enquanto os números seguem altos, o desafio é transformar o ambiente escolar em espaço de convivência segura e diálogo, onde a prevenção da violência se torne rotina.

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