CARLIANE GOMES
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O número de atendimentos a crianças e adolescentes nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) do Distrito Federal aumentou 33,47% entre 2023 e 2024, segundo dados divulgados pela Secretaria de Saúde do DF (SES-DF). O maior crescimento foi observado na faixa etária de 10 a 14 anos, com um salto de 9,2 mil para 13,5 mil atendimentos, um aumento de 45,6%. Entre jovens de 15 a 19 anos, o crescimento também foi significativo: os atendimentos passaram de 13,5 mil para 16,9 mil, representando alta de 25,15%. A rede de saúde mental conta com 18 Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que têm como objetivo atender pessoas com sofrimento mental grave, incluindo aquelas com transtornos relacionados ao uso de álcool e outras substâncias psicoativas.
Segundo a Secretaria de Saúde, o atendimento especializado a esse público ocorre principalmente nos Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis (CAPSi), voltados a crianças e adolescentes com intenso sofrimento psíquico ou transtornos mentais graves e persistentes. “Os atendimentos nos Capsi podem ser feitos por demanda espontânea ou encaminhamento da rede pública de saúde, educação, assistência social ou justiça. No primeiro atendimento, é recomendado que a criança ou o adolescente esteja acompanhado por um familiar ou responsável legal”, explicou a pasta.
Além dos CAPSi, a rede de atenção psicossocial do DF conta com outros serviços voltados ao cuidado da saúde mental de crianças e adolescentes. O Centro de Orientação Médico Psicopedagógico (COMPP) é responsável pelo atendimento de crianças de até 11 anos com sofrimento mental moderado. O acesso é regulado pelas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), que encaminham os casos após avaliação inicial. Para adolescentes entre 12 e 17 anos, o atendimento especializado é realizado no Adolescentro, que atua com foco semelhante ao do COMPP, voltado a quadros de sofrimento mental moderado. Assim como no COMPP, o acesso ao Adolescentro também é intermediado pelas UBSs. “A Rede de Saúde Mental Infantojuvenil está atualmente em processo de expansão, com a construção de novas unidades do CAPSi, além da ampliação e descentralização dos ambulatórios especializados e da criação de novas modalidades de atendimento voltadas às demandas em saúde mental”, reforçou a SES.
As Unidades Básicas de Saúde (UBSs) são a principal porta de entrada para os atendimentos em saúde mental no Distrito Federal. Segundo a Secretaria de Saúde (SES-DF), atualmente, 176 UBSs oferecem suporte psicossocial, com acolhimento, triagem e encaminhamento para serviços especializados, como os Caps e os ambulatórios. “As equipes são multiprofissionais e capacitadas para o acompanhamento integral dos pacientes”, informou a pasta. A secretaria destaca ainda a oferta de Práticas Integrativas em Saúde (PIS), como acupuntura, meditação, musicoterapia e yoga, que complementam os tratamentos convencionais. Entre as unidades com maior número de atendimentos no DF, a SES-DF aponta os Capsi da Asa Norte, Taguatinga, Sobradinho e Recanto das Emas.
Sinal de alerta
Para o psicólogo Jayme Rabello, o aumento de atendimentos entre jovens e adolescentes está relacionado à maior divulgação desse tipo de serviço e ao crescimento da discussão sobre saúde mental na sociedade. “As pessoas estão descobrindo que existem CAPS específicos para adolescentes, com profissionais e ambientes preparados para atender essa faixa etária”. Além disso, Rabello destaca que a maior abertura para falar sobre saúde mental e a busca por terapia contribuem para que cada vez mais jovens procurem ajuda. Segundo ele, o contexto atual, marcado pelo uso intenso de redes sociais e o excesso de informações rápidas, também tem um impacto direto na saúde emocional dos adolescentes. “Esse cenário aumenta a ansiedade e cria dificuldades para que pais e responsáveis compreendam o sofrimento dos jovens”, afirma.
Entre os principais transtornos que têm afetado essa faixa etária, psicólogo clínico comportamental aponta a ansiedade como o mais frequente, seguida por conflitos nos relacionamentos interpessoais, tanto com familiares quanto com amigos. Ele ressalta ainda que os adolescentes que viveram o período da pandemia, especialmente aqueles que começaram essa fase no início do isolamento social, enfrentaram um desafio maior no desenvolvimento das habilidades sociais, o que agravou o sofrimento emocional. “Os adolescentes vivem em um contexto com muito mais estímulos, como redes sociais, informação rápida e uso excessivo de telas, o que contribui para o aumento da ansiedade e impacta diretamente nas relações interpessoais”, explicou.
Entre os sinais de alerta que exigem atenção, Jayme destaca mudanças bruscas no comportamento e na rotina dos adolescentes. “Se um jovem que antes tinha um bom convívio social passa a se isolar ou se tornar mais conflituoso, isso pode ser um indicativo de sofrimento emocional”, alerta. Ele também chama atenção para alterações no padrão de sono, muitas vezes afetado pelo estresse, uso excessivo de telas ou situações como o bullying. A perda de interesse por atividades que antes despertavam prazer, como esportes ou hobbies, também pode ser um sinal importante. Segundo o especialista, é essencial que pais e responsáveis estejam atentos a essas mudanças e mantenham o diálogo aberto. “Estar perto e perceber essas transformações em tempo hábil faz toda a diferença para buscar ajuda no momento certo”, reforça.
Para Rabello, é fundamental que os adolescentes tenham um espaço seguro para expressar o que sentem. O acolhimento, segundo ele, começa quando o jovem se sente à vontade para conversar com alguém de confiança, seja um familiar, um professor ou até mesmo um colega. “Ele pode buscar informação e buscar as pessoas do convívio, professores, pais, familiares em que eles sintam conforto. É o conforto para o desconforto. Eu tenho que estar confortável para falar para alguém sobre o que me incomoda”. Ele também destaca que o diagnóstico e o início precoce do tratamento psicológico são decisivos para a saúde mental a longo prazo. Mesmo quando não há um transtorno específico, a terapia pode ajudar o jovem a desenvolver autoconhecimento e a lidar melhor com os desafios da adolescência. “Quanto mais precoce é a gente tratar todos os seres humanos com justiça, com adequação às características deles, melhor para todo mundo”, destaca Rabello.