“Quem está sendo prejudicado lá na ponta é o usuário e também os trabalhadores, que não têm sequer como comprar comida”, afirma o diretor vice-presidente do Sindicato dos Empregados em Instituições Beneficentes, Religiosas e Filantrópicas do Distrito Federal, Clemilson Correia, ao descrever um cenário crítico marcado por atrasos generalizados no pagamento das organizações da sociedade civil (OSCs) que executam serviços da Secretaria de Desenvolvimento Social do Distrito Federal (Sedes-DF), deixando milhares de funcionários sem salário desde outubro.
O problema, segundo o sindicato, é recorrente e se agrava. Hoje, 61 entidades parceiras do Governo do Distrito Federal operam sem receber os recursos previstos nos termos de colaboração. A consequência atinge diretamente cerca de 2.600 trabalhadores que não receberam o salário de outubro, a primeira parcela do 13º, e que agora caminham para um segundo salário atrasado em dezembro. No total, considerando todos os termos ativos, o impacto chega a 6 mil profissionais.
Clemilson relata que a categoria já se reuniu pelo menos seis vezes com a Sedes e com a Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal (Secec-DF), além de articulações com o Conselho de Entidades de Promoção e Assistência Social do Distrito Federal – (Cepas-DF). Nada avançou. “O que foi previsto e orçado para este ano foi aprovado no ano passado. Agora, o GDF retira o recurso do fundo, aplica em outras despesas e não tem condições de arcar com o pagamento”, afirma Correa.

Para que os repasses sejam regularizados ainda em 2025, seria necessária a aprovação de Projetos de Lei (PLs) enviados pela Secretaria de Economia à Câmara Legislativa do DF. Segundo Clemilson, alguns textos, porém, nem sequer chegaram à CLDF. O PL que estava na iminência foi aprovado ontem, no valor de R$ 12 milhões, e cobre menos da metade da dívida com as instituições, segundo o sindicato.
Impacto nos atendimentos e na vida dos profissionais
A assistência social do DF opera em rede: abrigos, centros de convivência, unidades de reabilitação, serviços para pessoas com deficiência, proteção básica e especial. A interrupção dos repasses, explica Clemilson, ameaça o funcionamento de diversos serviços essenciais.“A falta de repasse impacta no atendimento. O usuário é o prejudicado. As instituições não têm como manter 100% das atividades”, afirma.
Além disso, trabalhadores já enfrentam situações extremas: dificuldade para comprar alimentos, comprometimento de contas básicas, ações de cobrança e até busca policial por atraso de pensão alimentícia.“O trabalhador não paga porque não quer? Não. Ele não paga porque não recebeu”, reforça o dirigente.
Instituições no limite
Segundo o sindicato, diversas instituições já demonstram risco de colapso. Entre elas estão o Instituto de Inclusão de Desenvolvimento e Promoção Social, o Centro Educacional de Audição e Línguas do DF, a Casa Azul, os centros de reabilitação, entre outras. Algumas recorreram a empréstimos bancários para pagar trabalhadores e fornecedores, uma prática que não é possível para todas. “Noventa por cento das instituições não conseguiram pagar os empréstimos”, afirma Clemilson.
Mesmo que os recursos de 2025 sejam regularizados, o próximo ano já nasce com alerta vermelho. O orçamento da assistência para 2026 é insuficiente e garante execução apenas até agosto. “Em agosto do próximo ano a gente cai na mesma situação. Não tem recurso, e começa tudo de novo”, pontua o sindicalista.
Segundo Clemilson, a Sedes “já fez a parte dela” ao enviar toda a documentação necessária. O entrave estaria agora na Secec. E a decisão final, diz ele, passa exclusivamente pelo governador Ibaneis Rocha. “A Sedes não tem autonomia. A secretária já encaminhou tudo. Mas, se o governador não determinar que a Secec envie os PLs para votação, não se resolve nada este ano”, comenta Correa.
Caso a aprovação não ocorra ainda em 2025, o débito entra como restos a pagar, empurrando para 2026 uma dívida que já é monumental. O recado do sindicato ao governo é bastante direto ao GDF. “Gostaríamos que o GDF olhe com um olhar diferenciado para os trabalhadores da assistência e faça os repasses em até 24 horas após a aprovação dos PLs. É o mínimo para minimizar os danos causados a trabalhadores e instituições”, afirma Clemilson.
Em busca da solução
Procurada pelo Jornal de Brasília, a Secretaria de Desenvolvimento Social informou “que o investimento na assistência social foi triplicado nos últimos anos, com a maior expansão da história em vagas de acolhimento para crianças, mulheres, pessoas com deficiência, adultos e idosos”. A Sedes também declara que reconhece a importância do trabalho das entidades sociais parceiras. “Informamos que alguns repasses de outubro já foram realizados e que estamos atuado junto à Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) pela aprovação de crédito suplementar, ainda hoje [ontem], a fim de regularizar o pagamento o mais breve possível”, destaca nota.



